terça-feira, 20 de abril de 2010

É possível se pensar em uma "tradução neurológica" de felicidade? Não me refiro ao arrebatamento do êxtase, mas ao sentimento de felicidade.

O que é felicidade? Só muito recentemente a psicologia começou a investigar em que se baseia essa sensação. Do ponto de vista neurológico, não tenho conhecimento de nenhuma abordagem para avaliar esse estado interno.
Pra mim, a felicidade é um processo, uma trajetória que inclui alegrias e tristezas, mas que mantém no balanço um saldo de satisfação pessoal.
Agora, como atingir a satisfação pessoal?
Alguns dirão: fama, poder e riqueza. Exatamento o que os chineses antigos chamavam de "os três venenos do homem".
Outros procuram a relização nas coisas prosaicas, como a família, a profissão, o conhecimento etc. Também algo positivo, mas de certo modo circunscrito.
Na minha opinião, o nível mais alto de realização e o que proporciona a maior felicidade(por não se preocupar com ela) é a dedicação ao bem-estar dos outros.
Agir compassivamente para trazer paz aos outros é o nível mais alto de realização que alguém pode ter.
Certamente, os aparelhos neurológicos não conseguem ainda detectar isso. Vamos precisar de uma tomografia que registre a luz espiritual para isso. Quem sabe um dia... :-)

Questões sobre o cérebro ou a mente?

minha filha tem 19 anos e a acho com a mente muito infantil, parece que cada ano que passa a mente dela vai regredindo. ela já terminou o segundo grau, e sempre se saiu bem nos estudos, não tem amigos . gostaria de saber a que médico devo recorrer?

Olá! Uma avaliação multiprofissional, com neurologista, psicólogo(a), psicopedagoga(o) e, eventualmente, neuropsicóloga(o).
Muitas coisas podem ser causa. Déficit de atenção e hiperatividade é uma das mais comuns causas de diferença entre a idade cronológica e a mental.
Abs!

Questões sobre o cérebro ou a mente?

terça-feira, 9 de março de 2010

Hoje se sabe de todas funções das glândulas no cérebro? Existe alguma variação de suas funções nos seres humanos e nos animais?

O cérebro é composto por mais de 100 bilhões de neurônios, suas possibilidades combinatórias equiparam-se ao número de átomos do universo inteiro. Não apenas existe grande variação entre os seres humanos como também uma modificação infinita de estados mentais em cada pessoa ao longo do tempo.
Como não é possível controlar o estado de excitação de todo o sistema nervoso simultaneamente, temos que estudar sua atividade de modo compartimentalizado: função por função.
Mas na vida, a abordagem que temos de nós mesmos deve ser integrada e, desejavelmente, totalizadora.
Podemos dizer que nós vivemos em múltiplas dimensões se pensarmos que existe, por exemplo, um nível macroscópico de existência psicossocial e vários níveis microscópicos de existência, constituídos por nossos estados internos biológicos, moleculares, neurais etc.
De qualquer maneira, somos um todo vivo que age sobre e, ao mesmo tempo, reflete o meio ambiente interno e externo.

Como é possível que um pensamento - considerado apenas como uma reação química - pode ser capaz de gerar a sensação de "eu"? Ou melhor: como a neurofisiologia explica a "autoconsciência" (aquele que sabe que é um eu que sabe)?

A ciência tem progredido muito no campo da neurologia cognitiva e comportamental. Cada vez mais conseguimos localizar circuitos e sistemas neurais relacionados a processos mentais antes estudados apenas pela filosofia ou pela religião. Neurologistas como Antonio Damásio escreveram livros a respeito e pesquisadores como Tristan Bekinschtein têm acrescentado muito ao nosso conhecimento. A idéia de uma "mente incorporada" no cérebro amplia nossos horizontes científicos sem a dureza de posições totalmente reducionistas.

Questões sobre o cérebro, a mente ou a alma? Pergunte aqui e vamos conversar!

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Efeitos do tabaco e da maconha no cérebro

Em termos da medicina, drogas como o tabaco e a maconha são prejudiciais ou não ao cérebro? @moisesbasiliol
O tabaco e a maconha podem ser ambos nocivos ao funcionamento do cérebro, mas por mecanismos diferentes um do outro.
A maconha (Cannabis sativa) tem como principal princípio ativo o Tetra-Hidrocanabinol - o THC. Existem receptores nos neurônios espalhados pelo sistema nervoso central, específicos para esse composto e para os demais endocanabinóides. Os receptores tipo CB1 promovem a liberação de GABA(acido gama-aminobutírico) nas áreas da memória como hipocampo, amigdala e córtex cerebral. O resultado é uma lentificação do pensamento e comprometimento da memória. Crianças expostas à droga ainda no útero da mãe têm menor desenvolvimento intelectual em termos de atenção, linguagem e aprendizado.
A "química" da maconha permanece por semanas no corpo, mesmo depois da interrupção do uso.
Já o tabaco tende a agir mais lentamente, por via indireta. Como é responsável por doenças nos vasos sanguíneos de pequeno calibre, seu consumo por décadas pode comprometer a irrigação cerebral, causando microinfartos ou predispondo a grandes acidentes vasculares cerebrais.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

A transcendência e o si-mesmo. Pergunta dos leitores

Transcender a si-mesmo,é ir em busca de uma essência individual ou este movimento é coletivo?Se encontramos na essência um vazio, que não dá para ser nomeado, mas dá pra ser sentido,posso pensar então que: a ilusão se mantém pelos Pensamentos?
Transcender a si mesmo é diferente de transcender a si-mesmo. O si-mesmo, se pensarmos em termos junguianos, é já uma realização da personalidade integrada que não tem o que transcender porque reuniu tudo de modo harmônico.
Ultrapassar a si mesmo, por outro lado, significa derrubar as fronteiras do próprio ser para habitar o domínio do não-eu, exatamente onde encontramos "o outro". Significa ampliar a própria consciência, repensando o papel central que tínhamos atribuído ao nosso ego até aquele momento.
Quem quer transcender a si mesmo, deve libertar-se de si para se reunir com os outros em irmandade, compaixão e amor.

Teorias de Personalidade e Freud -- pergunta dos leitores

Caro Dr Roger qual a tua relação com o mestre Freud?
Acho que Freud foi um dos grandes teóricos da estrutura da personalidade, mas não definitivo. Certamente suas idéias de libido, Id, pulsão e recalque parecem funcionar bem, em termos de aplicabilidade prática. O mesmo acontece com a idéia de ego e superego.
Todavia, ainda que encontremos uma coerência interna apreciável, existem outras teorias que respondem igualmente bem às questóes da personalidade, a partir de outros conceitos. Um exemplo é a psicologia do desenvolvimento histórico-cultural de Lev S. Vygotsky.
O método da psicanálise freudiana é longo, mas bastante interessante ao utilizar mecanismos de frustração para produzir uma regressão terapêutica e depois iniciar o processo de reconstrução. O problema é que as defesas do ego e as resistências são grandes e muitos pacientes abandonam antes de atingirem os resultados possíveis.
No final, eu gosto de Freud, Vygotsky, Jung, Skinner e outros, pois vejo que cada um contribui significativamente para a compreensão do nosso modo de ser e de agir.
obrigado pela pergunta!

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Transtorno bipolar: o desafio diagnóstico. Pergunta dos leitores

Ei moço, gosto muito de vir aqui dar uma bisbilhotada.Gostaria de saber como o transtorno bipolar é diagnosticado.Se há cura e qual o melhor tratamento.É natural que quem tenha esse transtorno ñ saiba que tem?Beijão pra vc e obrigada pela atenção.
O transtorno bipolar, antigamente conhecido como psicose maníaco-depressiva, é diagnosticado com base na entrevista médica. Não é muito fácil fazer o diagnóstico, especialmente no começo, quando as alterações de humor são consideradas como eventos separados.
O importante é que são mudanças severas no tom emocional da pessoa, diferentes das variações de humor que normalmente temos. Nos períodos de depressão o paciente fica realmente deprimido, afastando-se do convívio social e até comprometendo seu lado profissional. Já nos momentos de mania ou hipomania é capaz de fazer coisas despropositais como comprar 50 pares de sapatos para o filho de 1 ano de idade, vender as propriedades da família imaginando fazer um ótimo negócio ou manifestar compulsões sexuais insaciáveis.
Os comportamentos gerados nesses períodos dão indícios da gravidade do humor envolvido e da necessidade de procurar um especialista. Existem medicações apropriadas para o controle dessa condição médica.
Mas nem sempre é fácil o paciente perceber que há algo errado, ainda mais se for adolescente. Por isso, o olhar atento da família e a abertura para conversar são fundamentais.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Perda de memória - pergunta do leitor

Caro Dr Roger sempre tive uma intensa velocidade de raciocínio, uma memoria quase fotografica e baixa necessidade de sono, 5 horas estava excelente, mas de dezembro para cá, parece que tudo piorou muito, o que tem me desanimado. será minha idade? tenho
A memória vai declinando naturalmente com o envelhecimento. Desde os 20 anos! Todavia, a causa mais comum de problemas de memória em paciente até os 60 anos é o esgotamento, o cansaço, o estresse físico e mental.
No consultório, podemos aplicar alguns testes cognitivos para determinar se o problema está realmente na memória ou em outro domínio mental, como a abstração, a linguagem ou a atenção e concentração. Evidentemente, se alguém está cansado a ponto de não conseguir prestar atenção nas coisas, não será capaz de reter as informações e não poderá recuperá-las posteriormente na forma de memória.
Para saber mais, veja o texto no meu blog sobre "Burnout" em http://estadoneurologico.blogspot.com/2009/07/sindrome-de-burnout-nova-face-do.html

Déficit de Atenção e Hiperatividade - pergunta do(a) leitor(a)

Gostaria de saber como o TDAH é diagnosticado pelo neurologista. Obrigada!!
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma patologia que fica na intersecção entre a neurologia, a neuropediatria e a psiquiatria.
As meninas tendem a apresentar um comportamento mais desatento, enquanto os meninos manifestam mais sintomas de hiperatividade. No primeiro caso, são crianças doces, gentis, mas com baixo desempenho escolar porque parecem viver no mundo da lua. Não se dedicam às tarefas e podem ser um pouco teimosos. Nos casos de hiperatividade, teremos os buscadores de emoções que sobem em telhado, brincam com fogo, atiçam o cachorro do vizinho, mexem com objetos perigosos como facas etc; e há também os buscadores de novidades que não permanecem mais do que poucos minutos em cada atividade, cansando-se rapidamente e procurando algo novo. Claro que essas manifestações apresentam-se em variadas proporções em cada pessoa e muitas crianças levam os sintomas para a vida adulta.
Há escalas que podem ser aplicadas pelo neurologista diretamente no paciente e outras destinadas aos familiares que ajudam na detecção dos sinais que caracterizam a síndrome.
Como é uma doença "da moda" temos que ficar atentos com o excesso de diagnósticos, seja pelos pacientes e familiares ou pelos médicos. Embora saibamos que há uma diminuição na atividade das projeções dopaminérgicas para os lobos frontais cerebrais, ainda há muito o que descobrir sobre a doença. No momento, temos facilidade em detectar os casos extremos, mas o limite entre o normal e o patológico está longe de ser bem compreendido.
As medicações usadas podem causar dependência química e psíquica, por isso devem ser prescrita de modo criterioso. Já a falta de tratamento pode diminuir as chances da criança concluir os estudos e até estar mais predisposta a drogadição.
Estamos à disposição dos interessados em saber mais sobre a doença.

Amnésia e Lapsos de Memória - pergunta do(a) leitor(a)

Obrigada por colocar seus saberes à disposição. Uma pergunta sempre me intriga: as amnésias temporárias, os lapsos da memória recente e a predominância de lembranças muito remotas e até mesmo desconhecidas são neurológicos?

Atualmente consideramos a existência de vários tipo de memória, tais como a procedimental, a memória de fixação, a memória de evocação e a memória tardia.
Há muitas doenças que comprometem predominantemente um ou outro tipo de memória.
No Alzheimer existe o que chamamos de um comprometimento escalonado da memória. Isso quer dizer que a pessoa doente vai perdendo as memórias mais recentes e, progressivamente as mais antigas, até as bem remotas.
Os problemas de memória precisam ser avaliados por neurologista com prática nessa área cognitiva.

Questões sobre o cérebro, a mente ou a alma? Vamos conversar!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A Mente e o Cérebro - pergunta do(a) leitor(a)

Roger, uma pergunta tem me intrigado: as reações do cérebro (químicas, elétricas etc) são CAUSAS dos pensamentos ou, ao contrário, são MANIFESTAÇÕES DECORRENTES do pensamento?A ciência neurológica pode ajudar nisso? Thomé/CTBA

Do ponto de vista da neurociência, os pensamentos e demais funções da mente são apenas produto das interações entre os neurônios.
Para que você tenha uma idéia, são mais de 100 bilhões de neurônios em um único cérebro. Cada neurônio pode ter conexão com mais de 10.000 outros neurônios, por meio das sinapses. Dessa forma, o número de combinações possíveis de conexões no sistema nervoso central é considerado maior do que o número de partículas existentes no universo!
Há teorias que acham que tudo é cérebro e que a mente é um criação cultural fundamentada na experiência subjetiva. Searle é um dos que advoga que o problema mente-cérebro não existe, é um artefato.
Outros acreditam que a mente é mais complexa do que o cérebro, mas interligada a ele. Essas teorias são formas moderadas de dualismo, conhecidas como emergentismo e epifenomenalismo.
Enfim, a questão não é resolvida e se desdobra em muitas outras bastante técnicas, na filosofia da mente e do conhecimento.
Espero ter sido o mais claro possível, mas não há como evitar certos termos técnicos ao tratar este tema.

Um abraço e obrigado pela pergunta.

Questões sobre o cérebro, a mente ou a alma? Vamos conversar!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Doença, dor e sofrimento

Eu tinha 16 anos quando entrei na faculdade de medicina. O ano era 1985 e por causa daquele vestibular em Londrina acabei tendo que conviver diuturnamente com o sofrimento, a doença e a morte desde então.
Não há nada mais acachapante para quem tem alguma inclinação para a espiritualidade ou para uma reflexão existencial do que esse contato íntimo com as vicissitudes humanas. Somente talvez a convivência com flagelos maiores, que ultrapassam o âmbito do indivíduo e sua família, pode ser mais gritante do que a vida dentro de um hospital. Estou pensando nas guerras, na fome que assola as populações africanas, nos campos de refugiados, nos guetos do nazismo e em coisas odiosas como o apartheid. Para essas não tenho grandeza de espírito necessária. Admiro quem dedica sua vida ao combate direto, in loco, a esses males.
De qualquer modo, a percepção imediata do sofrimento dos outros funciona como um balde de água fria sobre qualquer sonho de mundo feliz que um adolescente, como eu era ao percorrer pela primeira vez os corredores da sala de anatomia, possa alimentar. Apesar disso, entre optar por uma atitude fria e cínica diante da dor ou procurar desenvolver algum nível de contato com o sujeito que sofre; acabei escolhendo o segundo caminho.
Depois de tanto tempo debruçado sobre a literatura médica, conclui que por mais que estude sempre fica algo faltando. No máximo, quando alcanço o estado da arte em alguma moléstia específica, o que acontece é que compartilho a ignorância dos maiores cientistas do mundo. No quesito resolução de sofrimento, a medicina deixa ainda muito a desejar.
Por incrível que pareça, também não há resposta satisfatória na religião. Criam-se justificativas, promessas e apoio espiritual por meio de crenças em compensações posteriores, mas o sofrimento do aqui e agora permanece. Se houvesse um exorcismo realmente eficaz, por padre, pastor ou ministro - algo que realmente extirpasse a doença, os hospitais estariam com seus dias contados. Do mesmo modo, não há atos mágicos, manipulação de Chi ou meditação que repare algo concreto como um fígado cirrótico. Se é falta de merecimento, havemos de perguntar o que merecem então os doentes.
Ciência e religião podem nos ensinar a encontrar saúde no corpo, na mente e no espírito, mas apenas ANTES da patologia se apresentar. Certamente há curas milagrosas reinvidicadas pelas duas artes, mas são assim, milagres em condição de exceção, como são todos os milagres.
No final das contas, fazendo tudo ao alcance dos conhecimentos disponíveis oriundos de qualquer lado, o que sobra diante de nós é a dor e o sofrimento do ser humano vivo e físico, como nós mesmos. E para isso só há um remédio, aquele que está justamente no plano humano da existência. Para esse sofrimento, a cura é a compaixão, a solidariedade, a empatia possível apenas pelo contato caloroso de alguém que se identifique realmente com o outro.
É verdade que os médicos carregam sobre os ombros o peso da responsabilidade do diagnóstico correto, da prescrição inequívoca e da cirurgia precisa. Até mesmo nos cabe a função de dizer que chegou a hora de parar e deixar a vida atingir seu fim irrevogável. Mas penso que o médico(incluindo a mim mesmo) ainda está distante do nível de humanidade necessário para o tratamento do sofrimento. Vejo, por exemplo, que não teria o desapego de enfermeiras ou fisioterapeutas que lidam diariamente com as excreções normais e patológicas, dando banho, trocando ou aspirando os pacientes.
A doença é, certamente, um negócio para os profissionais da saúde, mas alguns acrescentam de si a compaixão que entregam graciosamente e então demonstram seu valor como pessoas. São poucos, mesmo porque tal dedicação é dura, dolorosa em si e até incompatível com a luta pela sobrevivência e com a pressa, sua filha dileta.
A espiritualidade e a inquisição interior dos motivos da vida e seus percalços são suportes fundamentais para organizarmos uma postura própria diante dos problemas. O conhecimento de tecnologias científicas e espirituais são ferramentas a serem adquiridas para o trabalho. Uma vez feito isso, é hora de partir para o campo real da batalha diária e procurar, sinceramente, fazer o melhor para o outro.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Dance, Magic, Dance: o labirinto da mente

O filme "Labirinto - a Magia do Tempo" marcou uma geração, levando-a a viajar com a heroína interpretada pela então adolescente Jennifer Connely através do labirinto mágico de Jareth - um feiticeiro poderoso interpretado por David Bowie. Na película lançada em 1986 e dirigida por Jim Henson o objetivo da protagonista era resgatar seu pequeno irmão aprisionado em um mundo habitado por criaturas monstruosas, mas ao mesmo tempo inocentes e cômicas em suas maldades. A trilha sonora ainda hoje é tocada nas rádios e provoca boas lembranças. Como toda fábula, sua interpretação pode ser feita em vários níveis e aqui vamos explorar um dos mais inusitados - o ontológico-espiritual.
Se você ainda não assistiu o filme, pare de ler esse artigo e se dirija à mais próxima locadora. Permita-se encantar pelo conto de fadas até que os efeitos especiais(hoje primários se comparados a "Matrix" ou "Avatar") se tornem reais para você. Antes de interpretações esotéricas, o melhor é se render àquela visão ingênua que a mente desarmada pode ter do mundo.
Feito isso, podemos retornar aos pontos alternativos de compreensão. Sim, pois a visão ingênua é a básica e fundamental, o resto são constructos que miram em última instância à recuperação da visão primeira e pura.
A estrutura do roteiro é de uma narrativa mítica tipicamente heróica. Abduzida da realidade racional, a heroína Sarah Williams(Connely) enfrenta a saga dos mitos gregos. Primeiro ela comete um erro, reafirmando sua humanidade falível, e é punida pelo sobrenatural. A seguir recebe o chamado e se lança em uma aventura rumo ao desconhecido, onde passará por dificuldades e enfrentará os perigos até se encontrar com seu grande rival. Quando, finalmente, derrota seu nêmesis alcança a redenção e sai da experiência triunfante, renovada e possuidora de um novo patamar de identidade.
Esse aspecto mítico, recontado em várias epopéias dos tempos antigos, é bem descrito e analisado por Joseph Campbell em "O Herói de Mil Faces". Fica a sugestão da leitura.
É claro que o filme, eminentemente simbólico, se presta também a análises psicológicas tanto de viés freudiano, como junguiano. Dá para se divertir com a estória explorando também essas possibilidades.
Todavia a que ofereço, nesse ponto, é uma perspectiva de caráter espiritual, com tendências interpretativas claramente orientais, indianas ou chinesas. Na busca de si mesmo, o adepto do caminho espiritual inicia uma jornada em direção à sua própria essência. Assim espera alcançar a reunião com a realidade cósmica, também entendida como O Sagrado. Por métodos e tecnologias ióguicas, contemplativas, meditativas e devocionais, de acordo com a escola seguida, o neófito persegue a reunião mística com sua origem primordial e comum ao universo.
No filme "Labirinto" podemos enxergar essa busca por si mesma na personagem principal. A dificuldade desse processo é simbolizada pelo enigma expresso no título do longa-metragem. O que faz, no entanto, transparecer o fato de que o terrível mago ou feiticeiro era a própria heroína projetada em seu oposto é que quando ela o derrota, ele afirma que foi ela quem pediu e chamou por ele. Além disso, a derrota do mal é conseguida pela súbita compreensão de que a garota era a criadora dele.
O vilão só tinha poderes porque a mocinha do filme os concedia a ele.
Fica clara, então, a analogia com a iniciação espiritual. Saímos em busca de uma essência, simbolizada por nossa identidade mais profunda e, quando a encontramos, descobrimos que a mesma não tem existência própria ou intrínseca. O feiticeiro pop-star é o Ego, o eu que imaginamos ser o senhor central de nosso realidade.
Mas tal qual o dono do labirinto na estória, o Ego é como um castelo, cercado por um labirinto, com guardas e ministros; tudo bem montado para proteger e preservar um rei que, na verdade, não existe. O Ego é uma ilusão sem consistência, sem um lugar para si que não o da fantasia, sem realidade inerente que lhe dê fundamento.
A ignorância nos mantém a crença de que no si-mesmo há algo palpável. Mas a essência espiritual, se podemos assim chama-la é vazia. Essa vacuidade não significa extinção. Quer dizer, no entanto, que nossos apegos e desejos não mereceriam tanto sofrimento de nossa parte caso compreendêssemos que não adianta dar presentes se não há quem os receba.
No Tao Te King, Lao Tsé afirma e depois pergunta: Quem sofre é o Eu. Se não há um Eu para sofrer, quem sofrerá?
Livres de expectativas, abertos à visão ingênua do mundo. Voltemos a ser crianças como um velho sábio chinês.



terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Aumentando a saúde, evitamos as doenças

Não sei se é verdade ou mito, mas dizem que os chineses antigos pagavam periodicamente seus médicos para que mantivessem sua saúde. E paravam de pagar se ficavam doentes. A função do médico era evitar que seus clientes ficassem doentes. A medicina preventiva era muito mais valorizada que a curativa, exatamento o contrário do que acontece hoje. Mas se, por um lado, a tecnologia empurrou a medicina para uma atitude reativa diante da doença; de outro, aumentou também a possibilidade de mantermos mais saúde seguindo informações acessíveis a todos.

A idéia dos povos do Extremo Oriente era de que um desequilíbrio energético sempre precedia a manifestação de uma patologia física. Tal alteração era passível de detecção ou tratamento por um bom curador, antes da doença se consolidar. No caso da medicina chinesa, bastava ao médico palpar os pulsos e ver a língua do paciente para reconhecer qual dos 12 meridianos pares ou dos 2 ímpares apresentava um bloqueio energético e, assim, o tratamento era realizado. Por meio da fitoterapia, da acupuntura, da moxa e dieta os terapeutas ajudavam o paciente a restabelecer seu Chi e, com isso, voltar a ter harmonia interna e externa.
É certo que atualmente não temos essa capacidade quase sobrenatural de detectar as alterações das energias sutis. Na verdade, os ocidentais nem acreditam muito nesse tipo de conceito. Todavia, ninguém fica espantado se dissermos que antes de aparecer uma úlcera gástrica, deve ter acontecido um desequilíbrio na função da produção de ácidos no estômago e que teria sido possível tratar a úlcera mesmo antes dela se manifestar, caso soubéssemos da hiperacidez.
O problema que queremos destacar é que apesar de sabermos das nossas doenças antes delas aparecerem, optamos por ficar alienados, ignorando os sinais que nosso organismo fornece.
Podemos compreender um pouco mais sobre a saúde se entendermos como nosso corpo mantém o equilíbrio, assimilando variações do meio interno ou externo enquanto permanece dentro de uma faixa de normalidade.
Uma das características fundamentais desse organismo altamente complexo e evoluído que temos é a homeostasia - a capacidade que o corpo tem de se recuperar de estados de desequilíbrio e voltar ao seu estado normal, atuando dentro de uma faixa de segurança.
Um exemplo de mecanismo homeostático é o controle da temperatura. Nosso sistema corpóreo consegue se manter facilmente por volta de 36 a 37 graus Celsius, mesmo que estejamos em ambientes que variem de 10 a 45 graus. Se está calor, suamos para resfriar; se está frio, trememos para aquecer.
A doença é a decorrência daquela situação extrema que ultrapassa os limites da capacidade de auto-regulação do corpo físico. Uma vez rompida essa barreira da saúde, o estado doentio se instala de modo progressivo até a deterioração completa do organismo ou morte. Eventualmente, novos estados de equilíbrio precário são alcançados, mas isso não impede o avanço de doenças como o diabetes ou a hipertensão arterial.
Se tivermos a capacidade de nos manter atentos aos nossos estados mais sutis, seja em nível mental, emocional ou físico, poderemos antecipar as situações que podem colocar em risco nossa saúde. Além disso, todos temos à disposição uma grande quantidade de informações que podem nos ajudar a encontrar mais saúde e alcançar maior longevidade.
Podemos adotar uma alimentação mais saudável para nós e para o planeta diminuindo o consumo de carnes e preferindo os pescados. Também melhoramos nossa saúde evitando os carboidratos simples como o açucar e as gorduras que aumentam o colesterol. A atividade física regular, a abstenção de fumo e dos excessos de álcool também favorecem maior saúde.
Pense como você quer estar, fisicamente, daqui a 5 ou 10 anos. Analise o quanto sua vida pode ser preciosa para seus filhos, amigos e companheiro(a) e como eles querem vê-lo(a) também no futuro. A alternativa para viver "dez anos a mil" não é viver "mil anos a dez". Com sabedoria é possível encontrar equilíbrio para viver uma vida significativa e longa ao mesmo tempo.